
UM DIA BELINHA AS LAGIMAS DISSERAM AO SORRISO: INVEJO-TE POR SERES TÃO FELIZ. E O SORRISO RESPONDEU: ENGANAS-TE! PORQUE MUITAS VEZES SOU O MAIOR DISFARCE DA TUA DOR!Nestas horas, em que escrevo, escrevo num muro branco, a carvão, em que as lágrimas me caem dos olhos sem as poder controlar, uma após outra, revoltadas e em fúria, num rosto já tão cansado, que me aliviam o peito e a alma. Queria falar mas não o faço, fico no silêncio a ouvir o que tenho a dizer, escutando-me, enquanto te procuro, na ânsia de saber mais sobre ti bela, decidi tentar descrever te através de palavras.
Bela, mulher dotada de uma inabalável determinação, onde o destino quis que a tua coragem fosse constantemente colocada a prova, o tempo encarregou-se de apagar os teus passos, pois a vida é demasiado cruel ao te retirar teu pai, mesmo antes de nasceres.
És grande, nunca conseguirei encontrar palavras de tal grandeza para poder falar de ti, de alguém como tu. Tu colocas quilos de ternura em tudo o que fazes e gramas de carinho em tudo o que dizes. Carregas em ti, um universo de mistérios, e dor.
Procura-me num olhar, que te consegues ver.
Procuro-te, talvez assim, um de nós, se consiga encontrar. Queria-te falar das coisas grandes que não me cabem no peito. Pois a dor, tal como o amor, têm muitas formas.
Belinha, chega-te a mim, pois vou dizer-te porque me dói, talvez depois percebas porque me dói cá por dentro, o coração, o peito, a alma, os olhos irrequietos e tristes que não encontram onde pousar.
Eles dizem para eu falar de ti, mas não sabem que, dizer o teu nome dói.
Para falar de ti preciso amarrar algures, a forte vontade de chorar, dizem-me para não chorar, talvez não saibam que há horas em que as lágrimas são o único alívio que temos para a alma, e em que no silêncio e no escuro do quarto o coração precisa de um espaço muito maior do que possuímos, porque somos apertados com a dor e até a dor precisa de espaço.
Dizem para falar de ti, imaginam tantas coisas porque não o sabem, os outros, os que o sabem, não o dizem. Não imaginam que há saudades que não nos cabem, no peito, não imaginam que és a mágoa mais dorida, mais impotente, mais eterna. Dizem isso porque não sabem, nem imaginam que existem sentimentos que vivem dentro de nós, sem descanso, que não nos deixam repousar.
Eles dizem que o tempo cura tudo.
Mas sabes avó? Eles mentem.
Porque há horas, que se enroscam na pele e não me deixam respirar. Porque há momentos em que o mundo é pequeno e sinto como se o ar me sufocasse.
Porque olho os dias que se seguem e encontro o céu sempre igual, o que sinto cá por dentro, nem sempre se traduz em palavras, e a tua morte seja apenas uma forma de ficares invisível aos olhos do mundo, mas posso dizer-te, de olhos rasos de água, que sinto a tua falta avó. E em todos os dias, estas lágrimas contidas quererem rebentar-me o peito, porque não há um dia que não lembre, de ti, que não pense em ti, se estivesses aqui, mesmo sabendo que estás, nesse estar sem estar, nessa ausência presente, ou nessa presença ausente que se chama saudade.
Grito por ti.
Chamo por ti.
Ou apenas digo baixinho: Avó.
Afinal, tu estás, hoje e sempre presente. Mas se estivesses aqui, hoje, queria dizer-te apenas uma coisa, ou duas. Talvez mais. Amo-te Avó. Tanto, tanto, tanto.
Belinha e a nossa volta, pessoas próximas que afirmam, conhecer-nos, e só provam o contrário, mostrando que nada sabem de nós, que conhecem a história, mas parece que não sabem a dor que nos acelera o bater do peito. Pessoas essas que nos tomam como abençoados e nem sempre sabem esperar, para nos ouvir, para saber a confusão dentro de nós mesmos.
Talvez encontremos na saudade um caminho, para o abrigo onde todos os anjos dormem.
Mas com o tempo, Belinha, vai ficando um pouco mais fácil falar da minha avó, mesmo quando as saudades querem rebentar-me os muros do peito, mas falar sobre ela, também começa a ser bom, porque até mesmo a pouco tempo não era assim, falar na minha avó, era sinonimo de chorar e os soluços não me permitiam falar, não penso menos nela, nem sequer me dói, menos a sua ausência, pelo contrário, ainda dói e muito, em todas as mudanças que a vida trás, ainda sinto muito a sua falta, tenho a certeza que é por ela que ganho em mim todos os dias mais coragem, e que em mim há tanto dela. Hoje.
Parece que foi ontem que disse, quando ainda não sabia que era o fim, que falei sem saber que eram as ultimas palavras, antes de saber que não havia mais nada depois: adoro-te avó, até amanha.
E sentir-me metade de alguma coisa enquanto, me senti um tudo de nada
